Pode 18, 2016

view of the Havana, Cuba skyline

Nota do Editor: Este artigo tambèm está disponível em Inglês e Espanhol.

Conforme as relações diplomáticas entre os Estados Unidos e Cuba continuam a descongelar, começa a se formar entre eles, gradualmente, um relacionamento econômico. Iniciaram-se os voos turísticos para a ilha e navios de cruzeiro começaram a fazer a viagem de 90 milhas para Havana. Uma relação bancária também está em seu estágio inicial, com o Stonegate Bank, baseado em Pompano Beach, na Flórida, tornando-se o primeiro banco dos EUA autorizado a conduzir negócios com Cuba. Recentemente, Karen Gilmore, executiva regional da Agência de Miami do FED de Atlanta, conversou com David Seleski, presidente e diretor executivo do Stonegate, sobre como seu banco conseguiu tal honraria.

Karen Gilmore: O Stonegate Bank é o primeiro banco dos EUA aprovado a conduzir negócios com Cuba. O Senhor poderia nos contar como o banco começou a percorrer esse caminho?

David Seleski: Inicialmente, atuamos como banco de uma empresa que fornecia produtos agrícolas para Cuba, e temos prestado serviços bancários para essa empresa desde 2011. Eu fui até lá várias vezes devido a esse cliente, principalmente para conduzir auditoria. Havia um banco baseado em Nova York que, originalmente, prestava serviços bancários para a parte cubana, e eles deixaram totalmente a função diplomática. Por cerca de quinze meses, a parte cubana estava sem qualquer serviço bancário; eles estavam negociando apenas em dinheiro. E isso estava prejudicando a emissão de vistos e as visitas de americanos cubanos as suas famílias.

Um dia meu cliente estava almoçando com o sub-secretário de assuntos cubanos. Eles estavam com dificuldade de encontrar um banco e disseram: "Bem, que tal o Stonegate?" Então eles pegaram o telefone e me ligaram. Primeiro fiquei bastante cético, mas depois de me reunir com representantes do governo cubano e conduzir nossa auditoria, decidimos ir a diante, e no momento seguinte, como vocês sabem, estávamos prestando serviços bancários para a embaixada [cubana]. Depois disso, começamos a explorar outras oportunidades e uma coisa leva à outra – não fazia parte de nosso planejamento estratégico, por assim dizer.

Gilmore: Como você poderia caracterizar a recepção desse novo acordo comercial por parte de seus clientes, conselho e pela comunidade?

photo of Stonegate Bank's Pompano Beach, FL location
Stonegate Bank's Pompano Beach, FL location

Seleski: Nós perdemos alguns clientes no Condado de Dade, mas ganhamos alguns clientes que apoiaram nossa posição. Então foi, provavelmente, elas por elas. Houve alguns protestos leves na porta de nossas agências, com oito ou nove pessoas por algumas semanas, mas, fora isso, a maior parte da comunidade nos apoiou. Mesmo as pessoas que não necessariamente concordam com o que estamos fazendo, acho que respeitam o fato de que corremos o risco na medida em que "é algo em que nós acreditamos". Algumas vezes, temos de assumir uma posição, e eu acho que [embora] alguns não concordem com o que fizemos, eles respeitam o fato de que nós progredimos e tentamos fazer isso.

Inicialmente, as relações diplomáticas dependiam de eles terem um banco e serem capazes de abrir a embaixada. Era realmente impactante as famílias se reunindo, as remessas acontecendo, e tudo o mais que estava havendo naquele verdadeiro resgate dos cidadãos cubanos. Para nós, inicialmente, não era uma decisão comercial; era mais uma decisão ética e moral sobre porque fizemos o que fizemos.

Gilmore: Por outro lado, no entanto, vocês tiveram de lidar com questões legais e regulatórias, pois vocês são um banco regulamentado. Quão difícil foi esse processo?

Seleski: Eu penso bastante sobre essa comunicação com os reguladores. Primeiro acho que eles estavam quebrando a cabeça para entender porque eu estava fazendo isso. Mas acho que grande parte disso era apenas informar-lhes, passo a passo, tudo o que estávamos fazendo. Acho que os reguladores têm sido muito prestativos em termos de certificarem-se de que estamos observando as políticas e os procedimentos, afinal, sejamos realistas: estamos no Sul da Flórida. Nunca, antes, prestamos serviços bancários a uma embaixada. Nós não estávamos na arena internacional e, de repente, temos uma conta de correspondente em um banco cubano. Então, acho que muito disso é apenas comunicação e confiança efetiva neles como parceiros, para que nos ajudem a navegar, tendo a certeza de que estamos fazendo tudo certo. Tanto o OFR [Office of Financial Regulation] quando o FDIC [Federal Deposit Insurance Corporation] cumpriram seu papel.

Gilmore: Chegando perto de completar um ano e meio desde que o banco foi aprovado pelas autoridades dos EUA para iniciar seu relacionamento com Cuba, quais são os obstáculos mais significativos que o banco tem de enfrentar?

Seleski: Acho que o maior obstáculo é simplesmente que você é pego na política entre dois países. Há novas ordens executivas que são emitidas, licenças em geral e muito disso é direcionado às atividades bancárias. Então você monta uma estratégia basicamente para descobrir como, por assim dizer, movimentar dinheiro entre os EUA e Cuba e então, de repente, surge uma nova ordem executiva e temos de começar tudo de novo.
é mais o fato de ser uma situação muito fluida e ter de obter a aprovação de ambos os lados para tudo o que fazemos. Demanda mais tempo. é um processo lento. Mas acho que todo mundo está se mexendo na direção correta.

Gilmore: Deve ser fascinante estar à frente nesse processo.

Seleski: Fascinante e frustrante.

Gilmore: Você vê outros bancos dos EUA seguindo os passos do Stonegate em pouco tempo?

Seleski: Espero que sim. Achamos que haverá oportunidades, e acreditamos no fim do embargo. Os cubanos se identificam mais com os americanos do que com os mexicanos, porto-riquenhos, espanhóis ou quaisquer outros. Acho que o que vai acontecer – quando o embargo acabar – é que os laços comerciais entre os dois países serão bem mais extensivos do que as pessoas imaginam. Quanto a outros bancos se envolverem, haverá oportunidades para ganhar dinheiro e prestar serviços a seus clientes. Acredito que quanto mais empresas americanas se engajarem e conduzirem negócios por lá, mais pressão será colocada sobre as instituições financeiras para que lhes deem apoio. O tempo dirá e acho que, com o tempo, cada vez mais pessoas estarão envolvidas.

Gilmore: Tendo sido o primeiro a ir, vocês, provavelmente, já desembaraçaram, para outros bancos dos EUA, muitos dos maiores obstáculos. O senhor vê isso como um caminho mais fácil para eles?

Seleski: Ah, sim, claro, sem dúvidas. Nós, definitivamente, somos cobaias. é provável que houvesse pessoas assistindo sentadas para ver como nos sairíamos, antes de entrarem nessa. Francamente, não os culpo – em alguns casos, isso faz muito sentido. Até agora tem sido muito recompensador e não tivemos nenhum problema. Acredito que estamos abrindo o caminho ou definindo o modelo para outros seguirem. Haverá necessidade, em determinado momento, do envolvimento de mais bancos americanos.

Gilmore: Se o senhor tivesse de assinalar três das conquistas mais significativas desde a aprovação de vocês como o primeiro banco dos EUA autorizado a fazer negócios com Cuba, quais seriam elas?

photo of David Seleski, president and CEO of Stonegate Bank
David Seleski

Seleski: Número um seria apenas o passo inicial. Nós não sabíamos como seria recebido. Tivemos segurança adicional em nossas agências no Condado de Dade — nós apenas não sabíamos como tudo isso seria recebido. Eu sempre rio sobre como eu contei para a minha administração sênior que estávamos fazendo isso, e todos eles falaram "Sim, sim, parece bom" e no fundo [eu acho que] eles estavam atualizando seus currículos. Nós não tínhamos a menor ideia de como iria acontecer.

Então essa foi a número um: apenas aquela primeira sensação de ansiedade, e não dormir por várias noites imaginando qual seria a reação [do público em geral]? Há cinco ou dez anos, acho que a reação teria sido totalmente diferente.

A segunda, na verdade, foi o desafio para nós, pois [que] ainda há o embargo, e os cubanos ainda não são capazes de operar totalmente em dólares e terem de corresponder a uma relação com um banco dos EUA. O maior desafio é apenas descobrir como fazer o dinheiro se movimentar de lá para cá – acredite se quiser, não é assim tão simples – e cumprir a regulamentação e fazer todos se sentirem confortáveis. Essa foi, provavelmente, a dificuldade número dois e, provavelmente, nossa maior conquista.

Acho que a terceira conquista foi conseguir fazer com que meus empregados e membros do conselho [embarcassem]. Eles se sentem muito entusiasmados com isso agora. Nós os levamos lá; eles viram como os cubanos apreciam o que estamos fazendo. E esperamos estar ajudando nesse processo. A meta aqui é realmente a liberdade econômica para os cubanos. Há meio milhão agora que trabalha na iniciativa privada e nós nos sentimos apoiando essa causa.

E eu acho que, de certa forma, muitos dos empregados estão bastante orgulhosos do fato de que o que fizemos foi ajudá-los a tocar a bola prá frente. Acho que essas são as grandes conquistas que conseguimos alcançar.

Gilmore: Por outro lado, se o senhor tivesse que assinalar três coisas essenciais para levar o relacionamento bancário entre os EUA e Cuba para o próximo nível, quais seriam elas?

Seleski: Neste momento, o maior problema ainda é fazer o dinheiro ir e vir. Ontem dei uma entrevista para Tampa Tribune sobre as transferências ainda ficarem retidas nos principais bancos, e acho que isso ainda vai continuar – de fato, quanto mais ordens executivas são editadas, mais complicado fica, pois, atualmente, não há uma licença específica para cada transferência. O que acontece é que isso cria mais incerteza quanto a essa ser uma atividade permitida ou não. Temos um desk de Cuba que lida com isso. Eles sabem, mas os outros bancos – se estiverem fazendo apenas uma ou duas transferências por mês ou algo assim – não vão saber.

Então eles veem Cuba e isso na verdade cria um pouco mais de confusão. Acho que o principal é óbvio, o embargo precisa terminar permitindo aos bancos cubanos ter uma relação de correspondência nos EUA. Acho isso essencial para fazer o dinheiro circular – acho que esse será mesmo o próximo passo na área financeira. Acho, também, que trabalhar para permitir que os viajantes dos EUA utilizem seus cartões de crédito lá [é essencial]. Do lado cubano, é essencial que eles tenham mais pontos de venda – é algo no qual estão de olho.

Gilmore: Agora que vocês são vanguarda e os primeiros lá, em retrospecto, sabendo o que sabem agora, vocês teriam feito o que fizeram?

Seleski: Acho que sim. Nós temos sido um banco de sucesso e parece até que nos últimos 18 meses temos sido definidos por Cuba. E hoje, anunciamos uma aquisição, e foi bacana – nunca mencionaram nada sobre Cuba. Quero dizer, somos muito orgulhosos do que fizemos, mas espero nunca mudarmos a forma de atendermos nossas comunidades, e nós ainda somos um banco da comunidade e, ainda assim, crescendo e ajudando as economias das nossas comunidades e os nossos clientes, seus negócios, e assim por diante. Isso é, provavelmente, a única coisa que meio que se perde nas mudanças.

Mas estamos muito orgulhosos do que fazemos e, sabe o que mais? Temos a esperança de produzir um impacto - de forma bem pequena - sobre 11 milhões de pessoas. E quantas vezes na vida temos a oportunidade de – como sociedade ou organização ou indivíduo – fazer isso acontecer?

E eu sinto que fizemos a diferença. Acho que continuaremos a pressionar politicamente o máximo que pudermos, e veremos onde isso nos levará.

photo of Karen Gilmore
Karen Gilmore

executivo da do FED de Atlanta Miami Delegação Regional